Para tentar estimular investimentos privados em mais de metade da malha ferroviária do País, que hoje está sucateada ou subutilizada, o governo publicou ontem um novo marco regulatório para o setor. Mas a estratégia da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) em forçar a competitividade nos trilhos, liberando o tráfego nos trechos ociosos para quem estiver disposto a passar com um trem, pode levar as concessionárias a uma corrida à Justiça.
Passados 15 anos desde as privatizações das ferrovias, o governo regulamentou as operações de direito de passagem e tráfego mútuo. As duas regras permitem o uso da capacidade ociosa de uma linha férrea por terceiros, desde que tenham os próprios vagões e trens. Também garantem que uma concessionária possa receber ou entregar cargas na malha de outro consórcio.
O regulamento possibilita ainda que as concessionárias requerentes do direito de passagem possam fazer investimentos de expansão quando não houver capacidade ociosa nos trechos ferroviários em questão. Nesses casos, elas terão direito à reserva dessa capacidade adicional. “Uma das metas é fazer com que as concessionárias usem melhor a capacidade ociosa”, afirmou o diretor-geral da ANTT, Bernardo Figueiredo.
Na prática, a medida acaba com o monopólio no uso das ferrovias, fato que deve gerar contestações das empresas que operam as linhas. Mas, para Figueiredo, as novas normas não significam quebra de contratos. “Temos respaldo jurídico. Respeito o direito de concessionárias questionarem na Justiça, mas não acredito que haja fragilidade jurídica no que está sendo feito.” Segundo ele, dos 28 mil quilômetros (km) de malha do País, 6 mil km não têm condições de trafegabilidade e outros 10 mil km estão subutilizados, sem circulação de trens.
Embora a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) não tenha se pronunciado sobre a publicação do novo marco, as empresas avaliam que, para eliminar os gargalos da malha existente, seria necessário investir R$ 10 bilhões.
A ANTT também revisou o regulamento que trata dos direitos e deveres das empresas que operam os trilhos e dos usuários desse serviço. Pelas regras, clientes poderão investir nas concessões, seja adquirindo trens próprios ou na expansão e recuperação da malha, podendo negociar uma compensação financeira com a concessionária.
As mudanças incluíram também a criação de metas de produção e segurança no transporte ferroviário, obrigando as concessionárias a apresentarem à ANTT estudos de mercado, planos de negócios, inventários das capacidades dos trechos e registros das operações efetuadas. As metas entram em vigor em 2012.
Enquanto as concessionárias estudam todos os pontos da resolução para possíveis questionamentos judiciais, os usuários de transporte ferroviário comemoram. Com as regras, eles poderão usar – por meio de um operador de transporte multimodal – a malha até então exclusiva às concessionárias. “Isso nos deu um novo alento”, diz o presidente da Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Cargas, Luis Baldez. Segundo ele, as novas regras vão aumentar a competitividade do transporte, reduzir os custos e elevar a participação do transporte ferroviário na matriz nacional.”
Nos bastidores, comenta-se que um dos principais beneficiados pela nova legislação é o empresário Eike Batista. Ele poderá usar a malha ferroviária da MRS para transportar minério de ferro de Minas Gerais para o Rio de Janeiro. Mas, para Baldez, o marco vai além. Vai trazer avanços para o setor de soja, que nos últimos anos sofreram com a falta de capacidade das concessionárias. “Tivemos graves problemas de atrasos de carga nos portos”, afirma Fábio Trigueirinho, da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: Agência Estado