Por Renato Dias dos Santos*
As atuais discussões políticas sobre o agronegócio nesse período de campanha eleitoral têm preocupado produtores rurais de todo o país.
Isto porque os dois candidatos à Presidência da República que ocupam o topo das pesquisas de intenção de voto têm posições diametralmente opostas para o setor, trazendo dúvida sobre os caminhos que o agronegócio seguirá caso um ou outro candidato vença as eleições.
Questões como a proximidade do Partido dos Trabalhadores (PT) com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e as ameaças históricas ao direito à propriedade privada que essa união fomenta, bem como os constantes ataques públicos que o candidato da legenda Luis Inácio Lula da Silva vem tecendo ao agronegócio ditam a inquietação de produtores rurais e entidades representativas da classe agropecuária.
Não obstante a hostilidade desse cenário, o que chamou atenção nas últimas semanas foi o deferimento de pedido liminar em ação direita de inconstitucionalidade proposta pelo PT para reduzir o período de semeadura de soja no Estado de Mato Grosso sob a alegação central de que não haveria estudos garantindo que o intervalo de plantio ampliado não traz riscos para a cultura da soja e, portanto, para o Estado de Mato Grosso (TJMT, Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1023567-31.2021.8.11.0000).
Com a decisão, o intervalo de semeadura foi reduzido para o período compreendido entre 16 de setembro e 31 de dezembro de 2022, contrariando a portaria do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que estabelece prazo até 3 de fevereiro de 2023 para os produtores do grão no Estado.
A definição dessa data não é mero preciosismo. O MAPA estabelece o período para a semeadura em vinte Estados e no Distrito Federal como parte do combate à ferrugem asiática, cujo objetivo é racionalizar o número de aplicação de fungicidas e reduzir os riscos de desenvolvimento de resistência do fungo que causa o problema.
Há que ser mencionado que a ferrugem asiática está entre as doenças mais severas que incidem sobre a cultura da soja, com danos que variam entre 10 e 90% da produção nas diversas regiões onde a praga foi relatada em níveis epidêmicos.
Por isso, nesses tempos de acirrada guerra política, o que não fica claro é o que um partido político tem a ver com a dinâmica do uso da terra privada em face de um setor econômico que, sozinho, representa mais de um quarto da riqueza do país (27,4% do PIB brasileiro, segundo a CEPEA), provocando uma intervenção judicial para que magistrados decidam quando agricultores podem ou não realizar seu ciclo de plantio.
Aqui vale o destaque de que o Estado de Mato Grosso está com uma safra inteiramente planejada e prestes a começar, o que gera grande insegurança para os produtores rurais e deixa uma série de perguntas em aberto: como fica o planejamento dos produtores agrícolas? Qual o impacto que essa decisão judicial trará para a economia do Mato Grosso e do Brasil? Quais serão os novos objetivos de um partido político em influenciar questões que deveriam ser, exclusivamente, técnicas?
A referida medida mais parece a já conhecida judicialização de interesses políticos de um partido que declaradamente não apoia o setor do agronegócio, desconsiderando completamente orientações técnicas estabelecidas e defendidas pelo MAPA e pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O ponto em destaque é que medidas semelhantes podem ser replicadas por todo o país, somando aos muitos desafios já enfrentados pelo agronegócio a incerteza de produzir sob uma e outra gestão governamental – o que não deveria existir em um setor econômico tão importante.
Aos produtores rurais, resta a esperança de defenderem seus direitos pela mesma via do Poder Judiciário quando seus interesses forem lesados, independentemente de qual governo estiver no poder.
*Renato Dias dos Santos | Sócio fundador do escritório Renato Dias dos Santos Advocacia & Consultoria | Advogado atuante em Direito do Agronegócio | Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) | Graduado em Direito pela Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) | Membro da Comissão de Assuntos Agrários e do Agronegócio da OAB/MS | Site: www.renatodiasdossantos.adv.br | E-mail [email protected]